Com “Firepower”, lendária banda inglesa de heavy metal vem sendo elogiada nos quatro cantos do mundo

Judas Priest | Foto: Justin Borucki

Não é sempre que uma banda se aproxima dos 50 anos de carreira e lança um álbum que é elogiado quase que unanimemente. Sempre há alegação que os integrantes ficaram sem inspiração e a aposentadoria se aproxima. Esse, definitivamente, não é o caso do Judas Priest. Com “Firepower”, seu décimo oitavo álbum de estúdio, o grupo de Birmingham (ING) vem sendo mais uma vez louvado pelo seu talento para fazer heavy metal. Na entrevista a seguir, o guitarrista Richie Faulkner fala sobre o momento, a situação de Glenn Tipton, a turnê com Lauren Harris e, no melhor estilo Rockarama, “Star Wars”!

“Firepower” acabou de sair e as resenhas que estão sendo feitas dizem basicamente: ‘uma obra de arte, essencial, de zero a dez a nota máxima’. Fale sobre o processo de composição e a pressão sobre uma banda com tal legado como o do Judas Priest.
Richie Faulkner: Tem toda razão. Por enquanto, a repercussão tem sido positiva em sua esmagadora maioria. Há, sim, uma pressão para que você melhore, mas não por causa de resenhas, mas uma determinação natural que todos temos na banda. E eu vejo isso em primeira mão, como nos esforçamos musicalmente, pessoalmente e como uma unidade. Acho que “Firepower” é uma extensão disso. Só tentamos fazer o melhor que podemos e sabíamos que tínhamos algo especial aqui. Quando se começa o processo de composição, nunca se sabe o que vai sair. Pode ser algo ótimo ou não tão bom assim (risos). Da mesma forma, podemos lançar algo que achamos bem legal e as pessoas não gostarem. Alguns dos álbuns mais mal recebidos da história pareciam boas ideias quando foram concebidos. Nunca se sabe. É empolgante criar, mas tem que se forçar como músico individualmente, e como parte de uma banda, para conseguir a melhor música, o melhor solo, a melhor bateria, a melhor emoção, a melhor letra e a melhor execução que puder. Para ser honesto, acho que alcançamos isso nesse álbum, estamos todos orgulhosos dele.

Richie Faulkner e Glenn Tipton | Foto: Mark Weiss

Qualquer um que conheça o estilo de tocar e compor de Glenn Tipton consegue ouvi-lo pelo álbum inteiro. Tocou todas as suas partes” – Richie Faulkner

Andy Sneap foi o produtor do álbum, mas agora ele se junta a vocês nas apresentações ao vivo do Judas Priest. Como será isso?
Faulkner: Bem, Andy foi a primeira escolha de Glenn. Já fazia parte da família, há a ligação com o álbum e obviamente com a banda, sabia da situação de Glenn (N.T.: o guitarrista está sofrendo de Mal de Parkinson), porque era o produtor e estava no estúdio e é um ótimo guitarrista. Nós pedimos para ele. Porém, disse que não queria ser visto como o novo guitarrista do Judas Priest, mas como o cara que está ajudando, substituindo Glenn, levantando o nome de seu antecessor na banda. Acho que isso é uma atitude nobre. Quando Glenn se sentir bem, poderá se juntar a nós no palco e tocar algumas músicas conosco. É uma boa situação e só vamos levando em frente. Tomara que consigamos trazer Glenn para tocar.

Qual a situação médica de Glenn? Os fãs ficaram sabendo recentemente. Há quanto tempo a banda já sabia e qual o tamanho da participação dele em “Firepower”? Comenta-se que, talvez, não tenha tocado no álbum inteiro, mas pelo que sei ele é parte do processo como um todo, certo?
Faulkner: 1000% correto. Foi parte de todo o processo de composição e qualquer um que conheça o estilo de tocar e compor de Glenn Tipton consegue ouvi-lo pelo álbum inteiro. Tocou todas as suas partes. É claro que no estúdio é diferente. Pode-se ir com calma e ele pode tocar apenas quando se sente bem. Ao vivo é diferente. Mas no álbum é tudo Glenn. Nós sabíamos há alguns anos, mas obviamente é uma questão particular, é a saúde dele e ele escolheu manter como uma coisa privada e o aplaudo por isso. Já estava sofrendo um pouco nos ensaios para a turnê do [álbum anterior] “Redeemer of Souls” e, em um estilo que é muito dele, enfrentou com tudo e superou. No início daquela turnê deixamos algumas músicas como “Painkiller” e “Electric Eye” de fora do set, mas, no decorrer, conseguimos colocá-las de volta pela determinação dele. E “Firepower” também é uma prova disso. Quando ouve, ali está um cara com Parkinson há dez anos! De novo, uma prova de como é um herói. Entendo que haja dúvidas [da participação dele no álbum] e sei por que existem, mas é ele quem toca ali, porque pudemos fazer com calma. Ao vivo é outra história, ele teve que abrir mão de fazer turnês e isso é muito corajoso. A prioridade dele era fazer o melhor para o Judas Priest e nós dissemos que o que fosse melhor para ele, seria para todos. Tem que se cuidar e quando estiver se sentindo disposto, pode tocar algumas músicas ao vivo no bis. Os fãs vão delirar.

Tomara que possa estar em todas as datas, nem que seja para acenar para os fãs. Sobre a arte do álbum, você teve alguma participação nisso. Como é esse seu envolvimento com a banda, além da música?
Faulkner: Todos nós tivemos participação e demos opiniões. Na verdade, um artista que conheço chamado Claudio Bergamin, que já havia feito algumas coisas para mim anteriormente, sempre me dizia que quando houvesse um álbum do Judas Priest, se eu poderia falar com o pessoal para que ele tivesse a oportunidade de mostrar as ideias dele. Então, assim que tivemos o título passei para Claudio. Ele conhece a banda, a história e fez algo que é como a música. Contém o poder de fogo (N.T.: trocadilho com o título “Firepower”) das faixas, uma referência ao passado, mas também é algo moderno. Foi exatamente o que queríamos! Quando vimos, foi imediato, mesmo ainda sendo um rascunho. Era feroz, intenso, fantástico. Todos os elogios para ele. Sobre meu envolvimento em outras coisas além da música, sempre foi assim. Desde que entrei, sempre foram muito inclusivos, me perguntando o que eu acho, quais minhas opiniões, o que mudar, como melhorar… É um exemplo perfeito de como você imagina que seja sua banda favorita por dentro. É uma aula de como ser uma banda. É um grande prazer ser parte disso.

Richie Faulkner | Foto: Ricardo Ferreira

Quando entrei não tinha a ilusão de uma carreira de 40 anos. Foram bem sinceros e me disseram que era uma turnê de despedida, não sabiam o quanto ainda tinham de fôlego” – Richie Faulkner

Muitas bandas e artistas levantaram a possibilidade de turnês de despedida. Elton John, Lynyrd Skynyrd e outros. Essa é uma discussão que o Judas Priest está tendo nesse momento, apesar de “Firepower” ter acabado de sair, ser um ótimo álbum, ter uma turnê programada? Há um plano para dar um ponto final nisso daqui uns três ou quatro anos?
Faulkner: Não. O foco no momento é o álbum, os fãs, a turnê e Glenn. É o futuro e acho que é assim que deve ser. Entrei na banda no que era para ser uma turnê de despedida (N.T.: Faulkner entrou no Judas Priest em 2011, substituindo K.K. Downing) e ainda estamos na ativa sete anos depois. Não acho que dê para fazer planos assim. Estamos empolgados com o novo trabalho, adoramos tocar no exterior e esses caras têm feito isso por quase 50 anos, o que é quase dez anos a mais do que eu tenho de vida! Há paixão, intensidade e muita empolgação com “Firepower”. É onde está nosso foco no momento.

Você, pessoalmente, pensa cinco ou dez anos na frente, quando o Judas Priest parar mesmo de fazer turnês, no que vai fazer? Vai continuar e se tornar um artista solo ou procurar outra banda para entrar?
Faulkner: Como eu disse, quando entrei não tinha a ilusão de que seria uma carreira de 40 anos. Foram bem sinceros e me disseram que era uma turnê de despedida, não sabiam o quanto ainda tinham de fôlego. Acho que seria besta em nem sequer pensar no futuro. Mas, para ser sincero, como eu disse, desde que me juntei ao Judas Priest, tenho tanta participação, liberdade de opinião, voz ativa e tanto respeito que quando recebo isso a única coisa que posso fazer é retornar mil vezes mais. Logo, olhando por esse ponto de vista, o Judas Priest é a minha banda. Não penso em fazer nada em paralelo ou tentar uma carreira solo. O Judas Priest é a minha banda, dou a ela 1000% e acho que é assim que deve ser. Eles mudaram a minha vida, então tudo que posso fazer é dar de volta tudo que eu posso.

"Firepower", novo álbum do Judas Priest

Luke Skywalker enfrenta desafios e derrota o Império da mesma forma que pode se enxergar ressurgir das cinzas em ‘Firepower’. São coisas que te levam para outro mundo” – Richie Faulkner

Como foi a aceitação dos fãs do Judas Priest a você? Porque já vi muitos substitutos em bandas e a primeira coisa que o fã quer é que o outro volte. No seu caso, não só eles o acolheram como você injetou nova vida à banda.
Faulkner: Acho que há um ceticismo saudável com qualquer mudança como essa, especialmente depois de 40 anos. K.K. é uma lenda e sempre será. Escolheu sair e toda vez que há uma mudança assim, pode ser até em um time de futebol, mas especialmente em música, no metal e no Judas Priest… Conhecemos os fãs, sabemos como podem ter opiniões fortes às vezes. As pessoas são muito apaixonadas por essa banda e como poderiam não ser? Mas os fãs confiaram, compraram seus ingressos com dinheiro de trabalho duro e deram uma chance à banda e a mim. Ainda há lugares e cidades pelo mundo em que os fãs ainda não me viram com a banda, mas eles confiam. Em 2015 tocamos na Nova Zelândia e o Judas Priest nunca havia tocado lá. Então, não é que nunca tinha me visto com a banda, nunca tinham visto sequer a banda. Ponto. É uma continuação dessa beleza que é levantar o nome do Judas Priest, do metal, do legado, do futuro, dos fãs e o que tudo isso significa. Posto isso, acho que foi essa razão de ter funcionado tão bem. Eu entendo a responsabilidade, o que significa para milhões de pessoas no mundo inteiro estar nessa posição. E não encaro isso como uma coisa comum, não encaro os fãs como algo corriqueiro. Dou 1000% para a banda, para mim mesmo e para o legado. Sei o que significa de forma intrínseca. Não preciso pensar sobre isso, não preciso virar um integrante do Judas Priest ou fã de metal, isso é o que eu sou como guitarrista, músico e pessoa. Eu não sei, mas talvez seja por isso que tenha funcionado tão bem.

Outra coisa pela qual você é conhecido e adora é “Star Wars”. Fale sobre sua paixão por isso, pois até tenho uma de suas palhetas com uma das naves nela. De onde veio isso?
Faulkner: Vem da minha infância. Somos todos crianças crescidas no fim das contas. Acabamos de lançar um álbum com um monstro de metal em chamas na capa. Somos todos crianças grandes. Há paralelos entre a ficção-científica e a fantasia com o ato de contar histórias no heavy metal. Há o elemento fantástico nas músicas e nos filmes e também os temas universais que tocam nossas vidas. Luke Skywalker enfrenta desafios e derrota o Império da mesma forma que pode se enxergar ressurgir das cinzas para fazer “Firepower”. São coisas que te levam para outro mundo, mas também toca em questões sociais e muito reais. Acho que há uma ligação aí. Por isso gosto de metal e músicas fantásticas, e encontro coisas assim em “Star Wars”. Essa é a ligação. Se você resume assim, é a mesma coisa, o filme só é a parte visual. Tenho umas palhetas com outros desenhos de “Star Wars” para a próxima turnê! (risos)

Richie Faulkner e sua Epiphone Flying V | Foto: divulgação

A Epiphone fez um grande trabalho. [A Epiphone Flying V] é baseada numa Gibson que vim personalizando pouco a pouco desde que entrei na banda” – Richie Faulkner

Falemos da sua guitarra customizada, uma Epiphone Flying V. Tem o logo do Judas Priest no headstock. Como foi o processo de construção dela?
Faulkner: Estamos fazendo os ensaios de produção, e tenho a usado neles, junto com minha Gibsons antigas e mais experimentadas. A Epiphone fez um grande trabalho. É baseada numa Gibson que vim personalizando pouco a pouco desde que entrei na banda. Eles [a Gibson] foram gentis o bastante para me fazer uma Flying V com Floyd Rose e venho montando aos poucos. Na verdade, é a mesma Gibson que sempre usei com algumas modificações, depois que me reuni com a Epiphone. Se fosse exatamente igual à outra, teria alguma coisa errada. Tem algumas coisas que expressam melhor quem eu sou. Você pode fazer isso, seja com um pincel de pintura, um lápis, um microfone, qualquer coisa. Para mim, como é uma coisa que veio evoluindo durante os últimos sete anos, combina comigo porque me permite criar e falar através da guitarra. Todos que vierem a um show poderão vê-la e ouvi-la. Fico feliz que tenha perguntado sobre isso, é um grande momento para mim, fazer parte da família Gibson.

Falando em família, você tocou com Lauren Harris, filha do baixista do Iron Maiden, Steve Harris, e fez a turnê do álbum “Calm Before The Storm” pelos EUA com ela. Como foi fazer parte daquela família e desse projeto? Sei que havia feito algumas coisas antes, mas foi esse o momento que prestamos atenção. Como foi a experiência?
Faulkner: (risos) Foi minha primeira experiência desse tamanho. Obviamente, nunca havia feito nada tão grande quanto o Iron Maiden, tanto em termos de turnê como de shows. Estava acostumado em viajar em tour busses e vans e, de repente, estava num avião 737 voando pelo mundo! Foi uma experiência incrível. Mas acho que, como você mencionou, o senso de família que há ao redor da banda, é isso que os permite fazer o que eles fazem. Foi um exemplo de ótimas pessoas, muita união e grandes experiências. Me ensinou muito sobre as viagens e a vida em turnê. Tocar para 80 mil pessoas é algo que você guarda para sua vida!

Tocaram no Wacken na Alemanha!
Faulkner: Lá tinha 85 mil pessoas. Você se sente como se estivesse lutando para sobreviver. Estávamos abrindo para o Iron Maiden, com Lauren à frente e nós, um grupo de desconhecidos, ao fundo. Não era o tipo de música mais difícil do mundo, mas ali estávamos honrando o que acreditávamos e dando 1000%. Essa é uma ética que carrego até hoje e isso se traduz no Judas também. Por causa daquela turnê, conheci as regras da estrada, sabia o que esperar. Não ia fingir no palco. Foi absolutamente essencial, ou pelo menos, um dos grandes motivos porque o Judas me considerou. Sabia o que fazer. Eu era relativamente desconhecido, mas já havia passado por aquele tipo de agenda e situação, então sabiam que eu aguentava. Gosto de pensar que aquilo contribuiu na minha entrada e aqui estamos sete anos depois. Foi uma grande experiência. Amo aqueles caras do Iron Maiden e todo mundo da banda de Lauren, que são como família, ainda mantemos contato. Somos grandes amigos. E esse é o poder da música, encontramos pessoas através dela e permanecemos amigos pela vida inteira.

Judas Priest: Scott Travis, Ian Hill, Rob Halford, Richie Faulkner e Glenn Tipton | Foto: Justin Borucki
Judas Priest: Scott Travis, Ian Hill, Rob Halford, Richie Faulkner e Glenn Tipton | Foto: Justin Borucki

Transcrito e traduzido por Carlo Antico.

Rock Talk with Mitch Lafon
The Secret Society 300

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